Psicanalista analisa a cobrança cruel da sociedade por padrões inatingíveis e explica que as cirurgias plásticas podem ser benéficas para a saúde física e mental, mas exigem atenção
Por que que a gente se cuida? Por que praticamos atividade física, restringimos a nossa alimentação e até mesmo recorremos a procedimentos estéticos como uma cirurgia plástica? A pergunta mais importante aqui não é por que, mas por quem?
“Dizer que não nos importamos com a opinião do outro é uma ilusão. Gostaríamos de nos importar menos. Formamos a nossa autoimagem a partir da maneira como nos vemos, mas também através da nossa percepção de nós mesmos através da visão do outro”, explica a psicanalista Maristela Carvalho.
Com a participação das redes sociais em nosso dia a dia, tanto a forma como somos vistos como a nossa percepção sobre a opinião dos outros muda a todo instante. Oscilamos de acordo com a nossa vulnerabilidade e com as diversas interferências que chegam através de outras pessoas, fatos do nosso dia a dia e traumas do passado.
“Quando estamos bem, com uma pessoa bacana do nosso lado e em uma relação saudável, ela nos joga pra cima, elogia, incentiva, nos fortalece. Por outro lado, um relacionamento com problemas, seja ele pessoal ou profissional, pode abalar a nossa autoimagem, nossa autoestima, a forma como lidaremos com as nossas frustrações ou como tentaremos solucionar aquela situação”, explica Maristela.
Segundo a psicanalista, não há nada de errado em não estar satisfeita com o que vemos no espelho e termos vontade de mudar, muito pelo contrário. Um corte novo de cabelo, um estilo de se vestir, a nossa rotina ou ambiente de trabalho podem necessitar de mudanças , acompanhando novas fases em nossas vidas. Da mesma forma questões maiores, como perder peso, ter mais foco na prática de atividade física ou realizar a tão sonhada cirurgia plástica.
“O importante é tentar enxergar se esta cirurgia é um desejo seu ou de outra pessoa. Se realmente queremos ou se é a única solução que estamos enxergando para resolver um problema, como uma crise no casamento ou a busca por uma colocação da profissional”, avalia.
Estar bem emocionalmente e ter um acompanhamento psicológico, especialmente no caso de procedimentos estéticos, é importante para alinhar expectativas com possibilidades reais. É preciso estar claro o que será feito e se o resultado esperado pode ser alcançado.
“O acompanhamento emocional pode ajudar a entender o que a incomoda, a origem do incômodo e inclusive avaliar se é um bom momento para resolver a situação, pois podem haver outras questões mais importantes para a sua angústia”.
Segundo Maristela, quanto mais for possível descolar a sua própria visão da que os outros têm de nós mesmos, poderemos cuidar da nossa autoimagem e autoestima. Precisamos, primeiro, entender o que realmente queremos e o que pode nos fazer bem.
A cirurgia plástica não emagrece, explica a psicanalista, e não deve ser realizada com este objetivo, mas pode ser um caminho para uma mudança neste sentido.
“Realizar uma lipoescultura, uma abdominoplastia, por exemplo remodela, tira o excesso de pele, de gordura. Há casos em que permitir que a mulher volte a ver um corpo que ela não via há muito tempo seja a motivação para regular a sua alimentação, voltar a praticar um esporte. Pode ser o início do caminho para equalizar aquilo que incomoda já há muito tempo”.
* Maristela Carvalho é formada em pedagogia pela PUC/SP; em psicologia pela Université Lumière Lyon II, na França; e em psicanálise pelo Centro de Estudo Psicanalítico. É membro do Grupo APOIAR e do Centro de Refugiados da USP, nos quais presta serviços de apoio à saúde mental para refugiados e pessoas em situação de vulnerabilidade social, e do Órion Instituto Médico.