Objetivo da entidade é discutir os problemas das Regiões Administrativas do DF, defendendo os interesses dos moradores. Na foto de Ailton de Freitas: Guilherme Jaganu, Hidelbrando Luztosa, Viviane Becker, Natanry Osorio, Dario Clementino e Solon Kouzak
Unir conselhos e associações de moradores do Distrito Federal para discutir os problemas que cada um enfrenta em sua Região Administrativa, traçando propostas de solução a serem apresentadas aos poderes Executivo e Legislativo locais. Este é o objetivo da União dos Conselhos Comunitários do DF (UCCDF), que acaba de ser criado, congregando, inicialmente, os conselhos comunitários dos lagos Sul e Norte, além do Park Way.
A ideia surgiu entre agosto e setembro deste ano, durante discussões destes conselhos acerca da nova Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos) e dos prejuízos que ela causará aos moradores, principalmente, destas regiões.
“Precisamos nos unir para defender os interesses dos moradores. Eles são o nosso público. Mas também estamos falando da capital federal e é preciso considerar que Brasília é a concretização de um sonho de todos os brasileiros, para o qual todos contribuíram com suor e impostos e, portanto, precisa ser respeitada e conservada”, afirma Viviane Becker, uma das fundadoras do movimento.
Em linhas gerais, uma das bandeiras da UCCDF é impedir que os bairros exclusivamente residenciais sejam transformados em bairros mistos, mediante a permissão de que “atividades econômicas” sejam exercidas nas residências do Lago Sul, Lago Norte e Park Way.
Na esfera ambiental, Viviane conta que outra missão da UCCDF é garantir a conservação dos parques e reservas já existentes e criação de novos espaços que preservem as nascentes e a vegetação. “Precisamos conscientizar as pessoas quanto à importância destes espaços dentro da área urbana. E especificamente no que se refere ao Lago Paranoá, conscientizar toda a população da importância das áreas verdes nos lotes residenciais dos lago Sul e Norte e Park Way, já que essas áreas verdes (que não podem ser compactadas) garantem a recarga dos aquíferos que abastecem o Lago Paranoá durante o período de seca”, explica.
Outra importante bandeira da União dos Conselhos Comunitários do DF é o respeito ao tombamento, como forma de preservar o projeto original de Lúcio Costa, garantindo uma das características mais marcantes da cidade, que é a setorização.
Na visão de Viviane Becker, os bairros não comportam as inúmeras atividades econômicas/comerciais que serão transferidas para esses locais com a aprovação da Luos. “Não temos estacionamentos, nem espaços para construí-los. Não temos também redes de água, esgoto e energia compatíveis para receber estas atividades, afinal nossas redes são antigas e não se pode esquecer que não apenas a atividade econômica fim será permitida, mas também a atividade meio, o que importará no afluxo de toda a estrutura administrativa de cada atividade econômica/comercial que se instalar nos bairros”, reforça.
Como se não bastasse, Viviane chama a atenção para os impactos no trânsito dentro de cada quadra, o que já ocorre com as inúmeras escolas que se instalaram nos bairros, a exemplo da QI 21 e da QI 19 do Lago Sul, onde, nos horários de entrada e saída das crianças, os moradores não conseguem entrar ou sair de seus conjuntos. “Se alguém precisar de socorro médico nestes horários, não o terá, simplesmente porque ambulância nenhuma conseguirá chegar nesses locais ou deles sair, por causa do trânsito”, afirma a advogada.
Para ela, a cada alteração legislativa no PDOT, LUOS e PPCUB, o gabarito de construção dos Lagos/Park Way vem sendo aumentado, de forma a, no futuro, permitir a construção de prédios residenciais nestes bairros, o que irá desfigurar completamente estas regiões, aumentando drasticamente a sua densidade populacional. “O aumento dos gabaritos retirará uma das características únicas da nossa capital, que é poder avistar, de qualquer local da cidade, a linha do horizonte. Um presente genial que recebemos de Lúcio Costa e encanta qualquer visitante”, conclui a líder comunitária.
Mas afinal, o que é esta tal de Luos?
Em termos práticos, a Luos é a norma que define as regras para ocupação das unidades imobiliárias na parte urbana das cidades do Distrito Federal. Fixa, por exemplo, área e altura máximas que a edificação pode ter, além de delimitar o uso para elas — comércio, habitação, serviços. A lei é instrumento complementar do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot) e deve estar compatível com ele.
Apenas um ano após a edição da LUOS vigente, o Conselho de Planejamento Territorial e Urbano (Conplan) aprovou a sua revisão, em novembro de 2020, e o respectivo projeto de lei ainda tramita na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). As mudanças foram aprovadas pela Comissão de Assuntos Fundiários (CAF) da casa e aguardam os pareceres de outras duas comissões para o envio ao plenário.
Apesar do caráter de urgência, a expectativa de deputados distritais é de que o texto seja colocado para votação até o fim de outubro, devido à complexidade do projeto. A aprovação da revisão da LUOS, editada em 2019, é aguardada pelo setor produtivo, pois é vista como uma possibilidade de aquecimento da economia do DF. E extremamente temida pelos moradores, por representar uma ameaça a preservação do meio ambiente, um desvirtuamento das características urbanas de cada região e a degradação da qualidade de vida.
Lideranças comunitárias
Além de Viviane Becker, que é 2ª vice-presidente do Conselho Comunitário do Lago Sul (CCLS), compõe a liderança da União dos Conselhos Comunitários do DF: Luiz Guilherme Jaganu, presidente do CCLS; Natanry Osório, 1ª vice-presidente do CCLS e ex-administradora do Lago Sul; Antônio Matoso Filho, prefeito da Prefeitura Comunitária da Península Norte; Francisco Sant’Anna, presidente da Associação dos Moradores e Amigos da Região do Parque Ecológico do Córrego do Mato Seco – AMAC/Park Way; e José Jofre Nascimento, presidente da Associação Comunitária do Setor de Mansões Park Way.
“Queremos que as boas práticas urbanísticas e ecológicas, que deram certo nos nossos bairros e que garantem uma boa qualidade de vida para os seus moradores, sejam estendidas para as demais áreas do DF. Que não nos seja subtraído o direito a uma cidade sustentável, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, a garantia do bem-estar dos moradores, apenas para atender a interesses econômicos e especulativos de poucos. Queremos que a setorização de usos dados ao imóveis no projeto original de Lúcio Costa, dentro das escalas monumental, residencial, gregária e bucólica, seja respeitado, simplesmente, porque Brasília não é uma cidade qualquer, mas um espaço que foi pensado e planejado para servir como capital da República”, finaliza Viviane.
Conheça as dez principais ideias da União dos Conselhos Comunitários do DF para melhorar e garantir a qualidade de vida dos moradores das regiões dos lagos Sul e Norte e Park Way:
1) Impedir a instalação de embaixadas/empresas não unipessoais nas casas dos bairros exclusivamente residenciais, conforme proposto no projeto da nova LUOS;
2) Retirar futuramente as atividades empresariais/comerciais/embaixadas que nos bairros já se instalaram, aguardando a aprovação posterior da legislação;
3) Atuar para que a administração autorize novas áreas comerciais apenas nos setores originalmente previstos, e que sejam criados pequenos parques ecológicos e de convivência comunitária proporcionais às áreas destinadas aos setores comerciais;
4) Atuar perante às Administrações para que seja avaliada a necessidade de cada bairro com relação à instalação de novas escolas e igrejas, considerando que os lagos Sul e Norte e o Park Way, por suas características ambientais, devem ter baixa densidade populacional;
5) Ampliação e conservação das reservas ecológicas já existentes;
6) Atuar perante a administração para que, no SHIS QI 17 seja criado o Bosque da Memória, em homenagem às vítimas do COVID (um projeto que tem diversas parcerias, inclusive com a ONU), em substituição à proposta da TERRACAP de criação de quatro novos conjuntos habitacionais em local sensível ambientalmente;
7) Atuação junto aos órgãos públicos em questões de impacto de vizinhança, impacto de trânsito, ecologia, tombamento, fechamento de becos e servidões de passagens desnecessários, segurança pública, assistência social, etc;
8) Atuação perante o Poder Legislativo federal em questões ambientais (ex., mudança do Código Florestal) e urbanística;
9) Conscientização da comunidade acerca das propostas legislativas e suas consequências;
10) Promover o diálogo entre os moradores e estimular a discussão sobre qual Brasília queremos deixar para as futuras gerações.