Após determinação judicial, Câmara e Senado deixam de exigir identificação do interessado em consultar vencimentos de funcionários das duas Casas. Legislativo era o único Poder que usava esse tipo de barreira
Por Luma Poletti, do Congresso em Foco – A remuneração de servidores da Câmara e do Senado já está disponível para consulta nominal. A iniciativa, ainda que tardia, foi decorrente de uma decisão do juiz Renato Coelho Borelli, da 20ª Vara Federal da Seção Judiciária de Brasília. Borelli determinou a divulgação de “informações relativas a gastos com agentes e servidores públicos (…) independente de qualquer tipo de condicionante, inclusive sem exigência de identificação do interessado e seu respectivo endereço, físico ou virtual”.
Para cada dia de descumprimento da decisão, as duas Casas deveriam arcar com uma multa de R$ 50 mil. A medida, que tem caráter liminar (provisório), decorreu de uma ação civil pública movida pela Procuradoria da República no Distrito Federal.
Até então, o Congresso não divulgava os salários de seus servidores por meio da chamada transparência ativa (quando a informação é publicada sem a necessidade de que o interessado tenha de solicitá-la ao órgão responsável). Para ter acesso às remunerações, o cidadão tinha de protocolar um pedido por meio da Lei 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação), preenchendo um formulário com informações pessoais, como número de CPF, endereço, e-mail e telefone. Nesse caso, o próprio servidor recebia uma notificação com os dados pessoais do requerente, o que gerava constrangimento e até discussões entre as duas partes.
O Legislativo foi o único Poder a adotar esse modelo de regulamentação. Alguns servidores chegaram a tirar satisfações com cidadãos que consultavam seus vencimentos.
“A condição imposta pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados, consistente na identificação do nome e do endereço do interessado, incluindo o endereço de IP (identificação virtual do terminal de acesso na rede mundial de computadores) resulta em violação da legislação de informação (…) causando indevido mecanismo de inibição”, diz a decisão, proferida em 17 de novembro de 2015.
“Vale lembrar, ainda, que não há justificativa plausível para a ‘barreira’ imposta pelas Casas Parlamentares, uma vez que o procedimento de divulgação de dados relativos à remuneração, subsídio e demais vantagens já é adotado em todo o funcionalismo público , não existindo norma que autorize o tratamento diverso no âmbito do Poder Legislativo”, completa o juiz.
Com a mudança, os salários dos funcionários (efetivos e comissionados) do Senado podem ser consultados sem necessidade de identificação no Portal da Transparência da Casa. No item “Gestão de Pessoas” o internauta deve clicar em “Servidores” e realizar a busca que desejar.
Na Câmara, na aba “Transparência”, localizada na barra superior da página, o internauta deverá clicar em “Recursos Humanos” e, em seguida, no link “Quadro de pessoal e estrutura remuneratória da Câmara dos Deputados”. Na nova página, logo abaixo de “Remuneração dos Servidores”, basta clicar no link “Consulta nominal”.
Supersalários
Em agosto de 2011, este site revelou que só no Senado 464 servidores recebiam acima do teto. Publicada a reportagem, o Senado decidiu cessar qualquer pagamento acima do patamar determinado pela Constituição. Em maio de 2012, porém, a Revista Congresso em Focoinformava que pelo menos 4 mil funcionários públicos – nos três poderes – eram contemplados com os chamados supersalários, isto é, com vencimentos superiores ao teto.
No Congresso Nacional, de acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), um em cada quatro servidores recebia acima do teto. Havia casos em que a remuneração de servidores superava R$ 100 mil por mês. O mais incrível é que em todas as situações descritas acima o cálculo do teto excluía uma série de benefícios pagos pela administração pública.
Como represália por ter divulgado lista com mais de 400 servidores que recebiam acima do teto no Senado, o Congresso em Foco foi alvo de 50 ações na Justiça movidas por funcionários da Casa. Mas o Judiciário arquivou todas as ações por entender que as informações eram de interesse público e não invadiam a intimidade dos funcionários.
No fim de 2013, por ordem do Tribunal de Contas da União, a Câmara e o Senado cortaram os salários recebidos além do permitido. Por causa da Lei de Acesso à Informação, esses dados passaram a ser públicos e divulgados, ainda que com algumas limitações, nas páginas das duas Casas legislativas.