Para falar do Vin de Constance, é necessário conhecer uma pouco da viticultura da África do Sul, seu país de origem. Constantia, onde o vinho é produzido, é na verdade, uma pequena zona delimitada em razão do seu terroir, o que é legalmente conhecido por lá como Ward, local onde se produz vinhos de alta qualidade. O lugar está ligado diretamente à Coastal Region, que é uma das áreas vinícolas mais importantes da África do Sul e que está bem próxima à cidade de Cape Town (não mais que 40 minutos). É ainda uma área com destaque histórico por ter recebido as primeiras plantações de uvas do país, em 1685, quando ao comandante da Companhia das Índias Orientais e governador do Cabo, o holandês Simon van der Stel, foi conferida uma área de 763 hectares que ele batizou de Constantia em homenagem a sua esposa. Hoje, a área foi desmembrada e é explorada por diferentes empresas familiares .
Essa Ward é a grande responsável por produzir o famoso vinho de sobremesa sul-africano conhecido como Vinho de Constantia. Bebida muito popular nos séculos XVIII e XIX, principalmente na Europa, onde foi apreciada por celebridades como Napoleão Bonaparte, Alexandre Dumas e Baudelaire. Infelizmente, por conta da filoxera e do oídio, esse vinho teve sua produção interrompida no final do séc. XIX.
Para se ter noção da importância da bebida no século XVIII, o vinho figurava no menu do famoso e chique restaurante Véry em Paris e era vendido por 40 francos cada garrafa de 500ml, enquanto o Chablis custava 10 francos e o Sauternes 25 francos.
Além disso, dizem os historiadores que Napoleão Bonaparte, já no séc. XIX, enquanto exilado em Santa Helena, desfrutava diariamente de uma garrafa do Vin de Constance e que, inclusive, solicitara, uma taça do vinho em seu leito de morte, recusando todos os demais alimentos e bebidas que lhe foram oferecidos.
Klein Constantia e Groot Constantia
Na década de 90, no entanto, os proprietários da vinícola Klein Constantia, situada em uma parte desse ward, retomaram a produção do vinho e o batizaram “Vin de Constance”; já em 2003, a Groot Constantia, outra vinícola da região, também começou a produzir o vinho e o batizou como “Grand Constance”. Ambos são feitos a partir da Muscat de Frotignan, nos mesmos moldes do original – com uvas passificadas na própria vinha e sem presença de botrytis e colhidas em diferentes momentos de sua maturidade, desde madura a supermadura, ou seja, um vinho de colheita madura feito também com uvas passificadas na própria videira. Normalmente, são vendidos em garrafas de 500ml e custam, aproximadamente 100 dólares. No Brasil, a safra 2015 está por volta de R$2300,00 no Mercado Livre.
Quando visitei a África do Sul, em época de final de colheita, pude passear entre os vinhedos recheados de uvas passificadas e concentradas de açúcar. Foi incrível poder experimentá-las diretamente das próprias vinhas e apreciar seu sabor doce, intenso e, ainda assim, ácido.
Claro que também experimentei o vinho pronto. No caso, degustei o “Vin de Constance”, da Klein Constatia, da safra 2015 – a melhor dos últimos anos. O que posso adiantar, para quem ainda não provou esse vinho, é que ele é simplesmente incrível. De cor amarelo dourado bem brilhante, é uma mistura de mel, frutas cítricas, frutas confitadas, amêndoas, e caramelo, além de frutas de caroço com um balanço perfeito entre acidez e doçura e que, mesmo sem botrytis é, sem dúvidas, um forte concorrente para os venerados Chateau d’Yquem e Tokaji. Nas palavras do escritor Alexandre Dumas (1869), inclusive, o “Vin de Constance rivaliza com Tokaji não só pela reputação mas também em excelência genuína”. Ou seja, é o tipo do vinho que deve entrar na lista de qualquer enófilo como meta para ser degustado nessa encarnação.